De vagabundo a dona de casa.
Boa-vida, agora Osvaldo queria ser chamado assim.
Há alguns anos, antes do Júnior nascer, sentia até uma ponta de orgulho pela alcunha que ostentava, mas para um pai de família não pegava bem.
Osvaldo era chamado de o vagabundo quando conheceu Amália, no post anterior ao último.
Hoje, o genro do seu Alaor já não é mais aquele. É só olhar a cara com que o homem anda.
Continua sendo pau para toda obra. Tipo raro, daquele com que se pode contar, que não deixa ninguém na mão.
Enquanto Amália começou a trabalhar fora, Osvaldo virou do lar.
Amália foi ser gerente da única butique da cidade. Loja da Dorinha, amiga de infância que viajou para a capital, tratou de enriquecer e voltou para investir no lugar onde nasceu. Queria assim garantir a tranqüilidade dos passados e o futuro dos próximos.
Enquanto Amália dava um duro danado gerenciando, atendendo, prestando contas, tudo sob os auspiciosos olhares de Dora, ele cuidava da casa e do moleque.
O garoto começou a freqüentar a escolinha, mas a vida de Osvaldo não acalmou. Ao mesmo tempo, começou a ir ao clube, às festinhas, ao parquinho, à praça e a um monte de outros lugares. Tinha também a lavanderia, a cozinha, os exames do seu Alaor, uma série de coisas para coordenar. Precisou até de uma agenda e, justo nesta hora, quando abriu na página do mês e do dia, no momento em que anotava seus afazeres no tal calendário, foi aí que ele se tocou. Era óbvio que algo estava errado, muito errado.
Pensou, se esforçou, fez memória e nada. Ao se dar conta de que não lembrava qual tinha sido a última vez em que ele e Amália tinham transado, feito sexo, amor, em que tiveram relação, ou seja lá como for que se chama isso atualmente, Osvaldo se deixou abater. Aturdido e desorientado pela já tardia constatação, o homem saiu vagando sem rumo. Foi parar no Galerias, um pequeno shopping a céu aberto, principal centro comercial da cidade. Lá encontrou Tereza, mãe de uma menina mais nova e de um menino um pouco mais velho do que Osvaldo Júnior.
Era visível que algo o abatera severamente. Tereza nem precisou lançar mão de seu sexto sentido.
Tereza:- O quê aconteceu, Osvaldo? Que cara é essa? Seu time perdeu?
Osvaldo:- Sei lá, eu não ligo pra futebol.
Tereza:- Então o problema é com a Amália. Meu ex-marido ficava com essa cara por dois motivos: mulher e futebol. O time era sempre o mesmo, já a mulher nem sempre era eu. Mas vamos lá, diz aí: o que aconteceu? Quem sabe… De repente eu posso ajudar.
Osvaldo:- Você acredita que só hoje, só depois de quase três anos, eu fui me dar conta de que... Bom, de que... Deixa pra lá.
Tereza:- Lembra quando a Amália estava grávida? Então, a gente conversava muito, ela me perguntava como era, como deixava de ser. O meu mais velho já tinha quase um ano e ela estava pra lá de ansiosa. Eu conheço a Amália... É sério, pode confiar.
Osvaldo:- Sabe, quando a gente se casou, antes dela começar a trabalhar na butique, era uma vida a dois, uma vida nossa. Hoje, ela tem a vida dela e eu também. É tanta coisa, tanto corre-corre, sinto falta de quando eu fazia as coisas que gostava, tinha tempo pra mim, pros meus amigos. Essa história de viver em função dos outros está me cansando.
Ele abriu o coração. Disse o que queria e o que não devia. O tempo voou. Pela primeira vez em quase três anos de casamento, chegou mais tarde do que o esperado. A vizinha já trouxera o Júnior, que dormia como um anjo.
Amália bebericava uma taça de vinho branco quando Osvaldo abriu a porta.
Ao contrário do que ele esperava, foi muito bem recebido.
Ela estava produzida e isso o levou a imaginar que logo sairia para mais uma reunião ou jantar de negócios, mas ela deu voz de comando.
Amália:- Vai tomar um banho, se trocar que hoje eu vou te levar pra jantar. As vendas de final de ano vão muito bem, o lançamento da nova coleção foi um sucesso. E outra: a Dora resolveu tirar férias, viajar por uns tempos e deixou a loja sob minha direção.
Osvaldo:- Mas logo hoje, eu tô tão cansado!
Amália:- O que é isso, Osvaldo?! Cansado, você?! Cansado de quê?! Queria eu ter esse vidão, ficar pra lá e pra cá o dia inteiro e no final, vem a pior parte, brincar com o garoto.
Osvaldo:- Vidão?! Minha vida é um vidão?! Hahaha, faz-me rir.
Amália:- Queria ver se eu não colocasse comida na mesa, aí eu queria só ver.
Osvaldo:- E eu queria ver se parasse de cozinhar o que a senhora iria comer.
Amália:- Olha, qualquer dia, qualquer hora, me dá a louca, eu pego minhas coisas e sumo.
Osvaldo:- E eu fico cuidando da criança. Não é qualquer dia. É todo dia. E não é qualquer hora. É sempre no mesmo horário.
Amália:- Quer saber: eu trabalho o dia inteiro que nem uma doida e nunca tenho tempo pra nada. Durante a semana é o patrão, os clientes, o trabalho e aquele bando de incompetentes que só servem pra atrapalhar. Aí, chega sábado e domingo é marido, filho, família, sogro, sogra.
Osvaldo:- O ex-marido da Terezinha reclamava exatamente das mesmas coisas.
Amália:- Terezinha? Que Terezinha? E como você sabe do que o falecido dela reclamava?
Osvaldo:- Sabe a Tereza, mãe do Luca e da Mariana, amiguinhos do Júnior? O pessoal lá da escola, você conhece… Então, encontrei com ela no Galerias.
Amália:- Ah, já é Terezinha a tal, tá pegando amizade fácil você agora, né?! Conheceu na reunião de pais e mestres, foi?! E o que tava fazendo no Galerias, a desocupada?!
Osvaldo:- Ela cuida da casa, dos dois filhos e do pai que já está de botas, só falta bater, coitado do velhinho. Não é desocupada nada.
Amália:- Que alma boa, não... Por que o senhor não vai lá ficar com ela? Com aquela... Aquela... Separada!
Osvaldo:- Divorciada, ela é divorciada.
Amália:- Melhor ainda, caminho livre até com o Papa.
Osvaldo:- Eu não! Vê só: se eu me casar com ela, quem vai trabalhar?
Amália:- Que foi agora? Tá rindo do quê? Deu pra tirar sarro da minha cara?
Osvaldo:- Não é nada, só uma coisa que a Terezinha falou.
Amália:- Outra coisa?! Fala bastante ela, não?! E o que mais a tal da Terezinha falou?
Osvaldo:- Que não adianta querer contrariar os fatos, essa tal igualdade é relativa, em muitos aspectos mulher é mulher e homem é homem. Foi, é e sempre será assim. É da natureza de cada um, de cada indivíduo.
Amália:- Ela falou tudo isso, é?! Mãe dedicada, filha exemplar e filósofa, haja saco... Eu vou pro bar.
Amália saiu e foi direto para a casa em que nasceu e viveu com os pais. Na falta da mãe, foi chorar mágoas no colo do pai, seu Alaor.
Amália:- Pai, eu acho que o Osvaldo tem um caso.
Seu Alaor:- Minha filha, o rapaz só faz é cuidar daquela criança, aliás, que meninão lindo meu neto, um colosso!
Amália:- Viu só como que é?! Se fosse a mamãe, ficava do meu lado, mas homem não entrega homem, isso é coisa de dedo-duro, covarde, não é assim?! E que tá me olhando com essa cara? Pai, fala alguma coisa.
Seu Alaor:- Como você se parece com sua mãe, impressionante! De repente me deu uma saudade.
Há alguns anos, antes do Júnior nascer, sentia até uma ponta de orgulho pela alcunha que ostentava, mas para um pai de família não pegava bem.
Osvaldo era chamado de o vagabundo quando conheceu Amália, no post anterior ao último.
Hoje, o genro do seu Alaor já não é mais aquele. É só olhar a cara com que o homem anda.
Continua sendo pau para toda obra. Tipo raro, daquele com que se pode contar, que não deixa ninguém na mão.
Enquanto Amália começou a trabalhar fora, Osvaldo virou do lar.
Amália foi ser gerente da única butique da cidade. Loja da Dorinha, amiga de infância que viajou para a capital, tratou de enriquecer e voltou para investir no lugar onde nasceu. Queria assim garantir a tranqüilidade dos passados e o futuro dos próximos.
Enquanto Amália dava um duro danado gerenciando, atendendo, prestando contas, tudo sob os auspiciosos olhares de Dora, ele cuidava da casa e do moleque.
O garoto começou a freqüentar a escolinha, mas a vida de Osvaldo não acalmou. Ao mesmo tempo, começou a ir ao clube, às festinhas, ao parquinho, à praça e a um monte de outros lugares. Tinha também a lavanderia, a cozinha, os exames do seu Alaor, uma série de coisas para coordenar. Precisou até de uma agenda e, justo nesta hora, quando abriu na página do mês e do dia, no momento em que anotava seus afazeres no tal calendário, foi aí que ele se tocou. Era óbvio que algo estava errado, muito errado.
Pensou, se esforçou, fez memória e nada. Ao se dar conta de que não lembrava qual tinha sido a última vez em que ele e Amália tinham transado, feito sexo, amor, em que tiveram relação, ou seja lá como for que se chama isso atualmente, Osvaldo se deixou abater. Aturdido e desorientado pela já tardia constatação, o homem saiu vagando sem rumo. Foi parar no Galerias, um pequeno shopping a céu aberto, principal centro comercial da cidade. Lá encontrou Tereza, mãe de uma menina mais nova e de um menino um pouco mais velho do que Osvaldo Júnior.
Era visível que algo o abatera severamente. Tereza nem precisou lançar mão de seu sexto sentido.
Tereza:- O quê aconteceu, Osvaldo? Que cara é essa? Seu time perdeu?
Osvaldo:- Sei lá, eu não ligo pra futebol.
Tereza:- Então o problema é com a Amália. Meu ex-marido ficava com essa cara por dois motivos: mulher e futebol. O time era sempre o mesmo, já a mulher nem sempre era eu. Mas vamos lá, diz aí: o que aconteceu? Quem sabe… De repente eu posso ajudar.
Osvaldo:- Você acredita que só hoje, só depois de quase três anos, eu fui me dar conta de que... Bom, de que... Deixa pra lá.
Tereza:- Lembra quando a Amália estava grávida? Então, a gente conversava muito, ela me perguntava como era, como deixava de ser. O meu mais velho já tinha quase um ano e ela estava pra lá de ansiosa. Eu conheço a Amália... É sério, pode confiar.
Osvaldo:- Sabe, quando a gente se casou, antes dela começar a trabalhar na butique, era uma vida a dois, uma vida nossa. Hoje, ela tem a vida dela e eu também. É tanta coisa, tanto corre-corre, sinto falta de quando eu fazia as coisas que gostava, tinha tempo pra mim, pros meus amigos. Essa história de viver em função dos outros está me cansando.
Ele abriu o coração. Disse o que queria e o que não devia. O tempo voou. Pela primeira vez em quase três anos de casamento, chegou mais tarde do que o esperado. A vizinha já trouxera o Júnior, que dormia como um anjo.
Amália bebericava uma taça de vinho branco quando Osvaldo abriu a porta.
Ao contrário do que ele esperava, foi muito bem recebido.
Ela estava produzida e isso o levou a imaginar que logo sairia para mais uma reunião ou jantar de negócios, mas ela deu voz de comando.
Amália:- Vai tomar um banho, se trocar que hoje eu vou te levar pra jantar. As vendas de final de ano vão muito bem, o lançamento da nova coleção foi um sucesso. E outra: a Dora resolveu tirar férias, viajar por uns tempos e deixou a loja sob minha direção.
Osvaldo:- Mas logo hoje, eu tô tão cansado!
Amália:- O que é isso, Osvaldo?! Cansado, você?! Cansado de quê?! Queria eu ter esse vidão, ficar pra lá e pra cá o dia inteiro e no final, vem a pior parte, brincar com o garoto.
Osvaldo:- Vidão?! Minha vida é um vidão?! Hahaha, faz-me rir.
Amália:- Queria ver se eu não colocasse comida na mesa, aí eu queria só ver.
Osvaldo:- E eu queria ver se parasse de cozinhar o que a senhora iria comer.
Amália:- Olha, qualquer dia, qualquer hora, me dá a louca, eu pego minhas coisas e sumo.
Osvaldo:- E eu fico cuidando da criança. Não é qualquer dia. É todo dia. E não é qualquer hora. É sempre no mesmo horário.
Amália:- Quer saber: eu trabalho o dia inteiro que nem uma doida e nunca tenho tempo pra nada. Durante a semana é o patrão, os clientes, o trabalho e aquele bando de incompetentes que só servem pra atrapalhar. Aí, chega sábado e domingo é marido, filho, família, sogro, sogra.
Osvaldo:- O ex-marido da Terezinha reclamava exatamente das mesmas coisas.
Amália:- Terezinha? Que Terezinha? E como você sabe do que o falecido dela reclamava?
Osvaldo:- Sabe a Tereza, mãe do Luca e da Mariana, amiguinhos do Júnior? O pessoal lá da escola, você conhece… Então, encontrei com ela no Galerias.
Amália:- Ah, já é Terezinha a tal, tá pegando amizade fácil você agora, né?! Conheceu na reunião de pais e mestres, foi?! E o que tava fazendo no Galerias, a desocupada?!
Osvaldo:- Ela cuida da casa, dos dois filhos e do pai que já está de botas, só falta bater, coitado do velhinho. Não é desocupada nada.
Amália:- Que alma boa, não... Por que o senhor não vai lá ficar com ela? Com aquela... Aquela... Separada!
Osvaldo:- Divorciada, ela é divorciada.
Amália:- Melhor ainda, caminho livre até com o Papa.
Osvaldo:- Eu não! Vê só: se eu me casar com ela, quem vai trabalhar?
Amália:- Que foi agora? Tá rindo do quê? Deu pra tirar sarro da minha cara?
Osvaldo:- Não é nada, só uma coisa que a Terezinha falou.
Amália:- Outra coisa?! Fala bastante ela, não?! E o que mais a tal da Terezinha falou?
Osvaldo:- Que não adianta querer contrariar os fatos, essa tal igualdade é relativa, em muitos aspectos mulher é mulher e homem é homem. Foi, é e sempre será assim. É da natureza de cada um, de cada indivíduo.
Amália:- Ela falou tudo isso, é?! Mãe dedicada, filha exemplar e filósofa, haja saco... Eu vou pro bar.
Amália saiu e foi direto para a casa em que nasceu e viveu com os pais. Na falta da mãe, foi chorar mágoas no colo do pai, seu Alaor.
Amália:- Pai, eu acho que o Osvaldo tem um caso.
Seu Alaor:- Minha filha, o rapaz só faz é cuidar daquela criança, aliás, que meninão lindo meu neto, um colosso!
Amália:- Viu só como que é?! Se fosse a mamãe, ficava do meu lado, mas homem não entrega homem, isso é coisa de dedo-duro, covarde, não é assim?! E que tá me olhando com essa cara? Pai, fala alguma coisa.
Seu Alaor:- Como você se parece com sua mãe, impressionante! De repente me deu uma saudade.